Grilagem de terras, conflito armado e coronelismo parecem ingredientes de uma história do século passado. Mas, na verdade, são passagens de episódios recentes ocorridos a pouco mais de 50 km de Goiânia.
De acordo com denúncias apuradas pelo Folha Z, uma família dona de extensas propriedades rurais no município de Leopoldo de Bulhões está envolvida em um conflito a respeito da posse de parte do terreno.
As informações repassadas ao jornal, corroboradas por testemunhas, documentos, fotografias e vídeos, dão conta de que os proprietários teriam alugado para terceiros uma parte de terra já vendida e relutado em dar posse para os compradores.
Histórico
As terras em questão são da família Reis, cujo patriarca é Antônio dos Reis. A fazenda de Antônio, que já teve 6 mil cabeças de gado e mais de 70 funcionários, hoje tem como atividade principal apenas o aluguel de terras para outros pecuaristas.
Foram dívidas e execuções judiciais que reduziram a atuação do empresário, outrora um dos maiores produtores de leite do Estado de Goiás.
Desde então, partes da propriedade foram vendidas, alugadas ou hipotecadas como garantia de empréstimos.
Esse é o caso da matrícula 4404, porção de 130 hectares (ou 1 milhão e 300 mil metros quadrados) da Fazenda Água Branca.
Em 2016, a propriedade foi usada como garantia de R$ 1 milhão e 700 mil contraídos como empréstimo junto à Cooperativa de Crédito Sicoob.
Meses depois, a matrícula 4404 foi substituída por outra, a 3684, como garantia do valor.
A venda definitiva dessa porção da propriedade foi efetuada apenas em maio de 2017, conforme apurou a reportagem junto ao Cartório de Notas e Registros de Imóveis e Anexos da Comarca de Leopoldo de Bulhões.
Segundo os compradores, porém, representados pela empresa Abu Dhabi, a propriedade continuava arrendada para terceiros, mesmo após a venda.
Entre os arrendatários estaria o prefeito de Leopoldo de Bulhões, Alécio Mendes (PR). O prefeito é dono de um leilão de gado na cidade e precisava de terras para a criação dos animais.
Para evitar a invasão de suas terras recém compradas, a Abu Dhabi decidiu então contratar uma empresa de segurança armada, responsável pela vigilância da propriedade.
Apuração
Na última quarta-feira, 28, a reportagem do Folha Z foi até Leopoldo de Bulhões. Lá, visitou o cartório, a prefeitura e a propriedade no centro do conflito.
No cartório, a escrevente Flávia Nunes confirmou que a posse da terra foi adquirida pela empresa Abu Dhabi Comércio e Participações LTDA.
Além disso, ela informou que não existe contrato de arrendamento oficialmente registrado para a matrícula 4404.
Na prefeitura, a reportagem foi informada por uma secretária de que o prefeito havia “acabado de sair para uma reunião” e que entraria em contato para agendar um encontro.
Sem retorno, o Folha Z tentou ligar por várias vezes em dois números de telefone celular do prefeito Alécio Mendes, mas não foi atendido.
Segundo um morador de Leopoldo, que preferiu não se identificar, ele foi contratado para retirar gado da propriedade ainda em 2018, após o surgimento do conflito, quando as terras já deveriam estar desocupadas havia meses.
Na propriedade, uma funcionária da família Reis que reside dentro da porção vendida disse que foi orientada pelo seu patrão a “não falar nada para ninguém”.
Outros funcionários da família, encontrados na sede da fazenda, disseram que não saberiam comentar sobre a disputa, que era travada pelos advogados das partes.
Reis
Em contato com o médico Leonardo Reis, filho de Antônio dos Reis e apontado como o representante da família nos negócios, a reportagem foi informada de que deveria falar com Antônio a respeito do assunto.
Leonardo, que é oftalmologista e preside o Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego), disse que “não estava a par da negociação”.
No entanto, o telefone celular de Antônio não foi atendido em nenhuma das vezes em que foi acionado.
O espaço da matéria segue aberto para que qualquer uma das partes que queria fazer esclarecimentos a respeito do caso.
PM
De acordo com o comandante da 47ª Companhia Independente de Polícia Militar, major Rubens, a corporação ainda não recebeu informações a respeito de uma disputa violenta no local, mas que averiguará o caso.
“Havendo um conflito armado, sem dúvida o comando regional da PM será informado”, disse o major.
A companhia tem sede na cidade de Silvânia, mas é responsável pelo policiamento em Leopoldo de Bulhões.
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