Demitir é um processo delicado que exige equilíbrio e maturidade, tanto para quem demite quanto para quem é demitido. Em geral, essas virtudes nunca estão presentes quando mais se precisa delas, razão pela qual as demissões são verdadeiros desastres que destroem a autoestima das pessoas em vez de projetá-las para um futuro melhor.
Há quinze anos, eu vivi o período mais difícil da minha vida profissional quando, por determinação da matriz, recebi a triste notícia de que a área que eu coordenava seria transferida para outro Estado, portanto, eu teria que desmobilizar a equipe, exceto aqueles que aceitassem a transferência para lá sem qualquer benefício adicional.
Em menos de três meses, fui obrigado a demitir quase toda a equipe que eu havia dado um duro danado pra consolidar. Éramos praticamente uma “família” que se desmantelou da noite para o dia.
Na prática, eu, o “paizão”, pouco pude fazer pelos “filhos”, porém, graças ao talento natural e à incrível capacidade de adaptação do ser humano, todos sobreviveram e hoje são excelentes profissionais em diferentes empresas e áreas de atuação.
Confesso, eu chorei um jarro de lágrimas e voltei pra casa o mais rápido possível quando fui demitido pela primeira e última vez. Graças a Deus, fui bem recebido e ainda ganhei os melhores presentes alguém pode desejar nesta condição: carinho e abraços.
Demitir é quase uma arte, afinal, não conheço ninguém que tenha sido treinado para isso, mas o fato é que, em cargos de liderança, não há como escapar dessa difícil tarefa cuja responsabilidade não pode ser transferida.
Como foi dito no início, demitir é algo que exige equilíbrio, bom-senso e maturidade, coisas que apenas o tempo é capaz de proporcionar, depois de muitos erros e acertos em termos de demissão.
Portanto, compartilho aqui algumas lições que me foram extremamente úteis nesse sentido e espero que sejam úteis quando precisar delas. Vejamos:
Pare de enrolar: a decisão está tomada, não tem essa de ficar esperando mais um tempo para ver se a pessoa melhora; se você já prestou um feedback realista, já deu uma, duas ou três oportunidades e já discutiu internamente, esperar mais do que necessário significa prorrogar o sofrimento de ambos os lados.
Assuma a responsabilidade: você participou da seleção e da contratação, treinou o profissional, prestou feedback, deu a ele várias oportunidades de melhoria e, mesmo assim, ele não conseguiu se desenvolver, portanto, nada de empurrar a bomba para o RH; você, o líder, é o único responsável pela demissão; se necessário, solicite a participação do RH, mas não transfira a responsabilidade.
Ajuste os preparativos: reúna os dados, alinhe com o RH, defina detalhes, ajuste o que for necessário – horas extras pendentes, extensão de benefícios, carta de demissão, bloqueio de sistemas etc. – e mantenha sigilo até o dia da demissão.
Tudo tem a sua hora e o seu local: quando tiver que fazê-lo, faça-o em local reservado, preferencialmente, longe da equipe para evitar constrangimentos desnecessários; quanto ao horário, depende do gestor, mas eu preferia ao fim do expediente, longe dos olhares do grupo e, na maioria dos casos, antes das férias para evitar que a pessoa torre a grana nas férias, volte zerado e ainda receba a infeliz notícia da demissão.
Trate bem as pessoas: seja gentil e transparente, mas não tripudie. É um momento difícil para ambos, a menos que você seja desprovido de hormônios; qualquer reação diferente disso pode acirrar os ânimos e terminar em acusações ou insultos.
Pare de inventar: não tente justificar o injustificável, portanto, se você não quer ou acha que não pode dizer o motivo, seja simples e direto: “a partir de hoje, você não faz mais parte do quadro de colaboradores da empresa, portanto, quero agradecer pelo trabalho realizado até agora e lhe desejar boa sorte na sua próxima caminhada.”
Prepare-se para o inesperado: se ouvir algo que não lhe agrada, mantenha-se frio feito gelo e flexível feito bambu, ou seja, administre suas emoções e esteja disposto a ouvir, mas não revide, afinal, se a decisão está tomada, o que você disser e ouvir não deve alterar o resultado.
Evite desculpas e promessas: não há o que desculpar nem o que prometer, afinal, se você errou, vai aprender com o erro e fazer diferente da próxima vez; prometer alguma coisa só é possível quando você tem poder decisão ou quando a política da empresa permite. Portanto, não tente corrigir o problema prometendo algo que não pode cumprir.
Paciência, paciência, paciência: nesta hora, dois ouvidos são mais importantes do que uma boca, portanto, mantenha a calma para que a dor e raiva sejam diluídas com um pouco mais de tempo; na medida em que a pessoa vai falando, ela tende a refletir e absorver melhor a situação.
Alinhe a equipe: não deixe que a equipe conspire no corredor, seja o primeiro a comunicar o fato sem tripudiar sobre o demitido e aproveite para realinhar suas expectativas em relação ao que se espera deles a partir do ocorrido.
Há pouco tempo eu fui ministrar um treinamento para líderes de uma grande empresa paranaense e, para minha surpresa, uma profissional demitida por mim naquela difícil missão de quinze anos atrás fazia parte do grupo participante.
Não havia como renegar o fato, mas ao relembramos o assunto ela simplesmente declarou: você foi tão gentil e elegante que eu fui para casa com uma sensação de alívio.
Você pode ser chefe, supervisor, gerente ou diretor, metido a durão ou o todo-poderoso da empresa, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel. Profissionais são, acima de tudo, seres humanos.
Pense nisso e empreenda mais e melhor!
Jerônimo Mendes é administrador e professor do MBA Executivo em Liderança e Gestão Organizacional do Instituto de Pós-Graduação e Graduação
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