O brasileiro, aos poucos, vai se acostumando com as variações de embrulho no estômago provocadas pela corrupção. Adulterações e fraudes envolvendo derivados do leite eram os mais comuns. Deflagrada há dois anos pela Polícia Federal do Paraná, a Operação Carne Fraca trouxe o produto para o centro do debate da enganação. Impossível não sentir náusea após gravações telefônicas confirmarem reaproveitamento de carne bovina vencida, contaminada ou misturada a papelão em frigoríficos pelo país. Delegados da PF utilizaram a expressão “estarrecedor” para definir o envolvimento de servidores do Ministério da Agricultura no esquema. Estarrecedora, sim, ficou a cara do cidadão que acreditava estar consumindo uma das carnes mais saborosas e qualificadas do planeta.
O balanço da maior operação deflagrada pela PF até hoje – cerca de 1,1 mil agentes espalhados pelo Paraná, Minas Gerais e Goiás – será feito nas próximas horas. Ministério da Agricultura e os grupos JBS e BRF, controladores das marcas Sadia, Perdigão, Seara e Friboi, entre outras, já divulgaram suas notas de esclarecimento apoiando as investigações. Tudo correndo dentro da mais perfeita rotina para um país habituado às operações comandadas pela PF e pelo Ministério Público. O agravante decorre das revelações de que ácido e cabeça de porco foram misturados à carne para manter o aspecto e ampliar a vida útil. Trata-se do fundo do poço em matéria de vantagem ilícita. Milhões de brasileiros comendo o pior dos produtos enquanto uma quadrilha da pior espécie comemora a desgraça alheia.
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Sete são os crimes cometidos por três bandos distintos, entre eles adulteração, falsificação e corrupção. A propina, como sempre, corria solta nos gabinetes e frigoríficos. Nem mesmo a carne fornecida para merenda escolar em escolas públicas foi poupada pelos criminosos. Nenhuma compaixão com crianças e adolescentes, afinal o importante é lucrar com as mazelas.
Com bandidos cada vez mais inescrupulosos, a PF decidiu chamar atenção para a fragilidade moral dos agentes públicos federais que deveriam zelar e fiscalizar a carne consumida no país. A denominação Carne Fraca, todavia, encaixa como uma luva no momento por que passa o país das máfias, o Brasil do jeitinho. A classe política está envolvida novamente – PMDB, PP e PTB receberam vantagens – mas a sociedade não consegue mais apontar o dedo somente em direção aos governos. A degradação ética atingiu um patamar nunca antes visto na história deste país.
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