Faz-tudo: vítima ou vilão?
Três meses se passaram e nova enxurrada de fatos me estimula a retomar o assunto sobre a morte do cantor Cristiano Araújo. O alerta sobre o uso do cinto de segurança no banco de traz do veículo foi substituída pela reflexão sobre o papel do faz-tudo na vida de uma celebridade. O até então anjo protetor Ronaldo Miranda, aquele que se considerava iluminado por fazer parte de uma história de sucesso na música brasileira, hoje é o protagonista de uma polêmica que expõe a linha tênue entre confiança e profissionalismo.
O amigo-motorista-segurança Ronaldo Miranda dirigia a 179,3 km/h e promoveu mudanças nas rodas do veículo que interferiram na sua estabilidade. Por isso foi indiciado pelo crime de duplo homicídio culposo, quando não há intenção de matar. Se já não bastasse a culpa íntima pelo fim trágico de Cristiano Araújo e sua namorada Allana Moraes, Ronaldo se transformou num misto de vilão e vítima da intimidade com o patrão. Avançou tanto em outras áreas e descuidou das regras básicas da proteção, da segurança do cantor.
Visões bem distintas
Mas qual faz-tudo de celebridade não comete erro semelhante na agenda corrida do dia-a-dia? A mãe de Cristiano Araújo, Zenaide Melo, eximiu Ronaldo Miranda pela responsabilidade do acidente: “Ele era um amigo fiel do meu filho e dos meus netinhos e continuará sempre presente na vida deles e na minha”. A mãe de Allana, Miriam Carvalho Pinto, aprofundou o debate: “Não gostaria que ele fosse indiciado. Por mim ele não seria. Lógico que o Ronaldo tem responsabilidade, porque estava dirigindo, mas não tem culpa. Ele estava em alta velocidade, mas minha filha e o Cristiano estavam sem cinto. Isso contribuiu muito (para as mortes)”.
Na contramão do pensamento feminino, o pai de Cristiano, João Reis, foi taxativo em relação a Ronaldo Miranda: “Nunca mais quero vê-lo porque não sei qual seria minha reação. O que sempre peço para as pessoas que convivem com ele é para que nunca mais passe na minha frente”. O desabafo em tom de ameaça contém uma carga pesada de discussões entre João e Ronaldo sobre excesso de velocidade nas rodovias e controle da agenda do cantor.
Impor limite
Envaidecido por desfrutar diretamente do sucesso de Cristiano Araújo, Ronaldo Miranda esqueceu que era a parte mais vulnerável da cadeia artística: o “famoso” carregador de piano. Aceitou acumular funções e passou a viver a vida do amigo, criando um vínculo ao mesmo tempo intenso e frágil.
A proximidade com o cantor, com o ator, com o jogador de futebol, com o político, enfim, é aquela que mais desperta vaidade, ciúme e carga de trabalho. Distinguir amizade e cumplicidade das obrigações profissionais é o grande desafio dos milhares de Ronaldos Mirandas espalhados por aí. Saber dizer não e impor limite são requisitos básicos para o assessor que não pretende se transformar na bola da vez de eventuais tragédias.
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