Por Rodrigo Czepak, com a colaboração de Marco Faleiro
Já se passaram duas décadas e a história do bandido ousado e sedutor permanece mais atual do que nunca.
Leonardo Rodrigues Pareja, à época com 22 anos, se transformou em celebridade nacional do crime por abusar do deboche e da ironia em todas as circunstâncias.
“Não sou super bandido, mas certamente sou mais inteligente do que a polícia”
Comandou sequestro, assalto e até rebelião no antigo Cepaigo sem nunca perder as características de psicopata manipulador que transformava boa parcela de suas vítimas em fãs excitados.
“Eu não existiria se não fosse o perigo”, declarava aos repórteres. “Não sou super bandido, mas certamente sou mais inteligente do que a polícia”, complementava com sorriso sarcástico.
A adrenalina de Pareja durou pouco mais de um ano: de setembro de 1995 a dezembro de 1996.
Nesse curto espaço de tempo ele assaltou um hotel em Feira de Santana (BA) e conseguiu a façanha de manter uma garota de 16 anos como refém por 3 dias.
Detalhe: a jovem Fernanda Viana era sobrinha do então senador Antônio Carlos Magalhães (ACM), o todo-poderoso baiano da época.
Passando por 3 Estados, Pareja deu entrevistas e brincou de cão e gato com a polícia até se entregar 1 mês depois.
Ele adorava flertar com o perigo, zombar de quem o caçava.
“Eu sou humano com quem é humano e sou cruel com quem é cruel”, avisava às vítimas logo no primeiro contato.
Essa era a personalidade de um jovem bonito, cara de galã, e que havia estudado inglês, espanhol, violão, piano e programação de computadores.
Virou bandido por causa da índole e não por influência ou necessidade.
Leonardo Pareja no Cepaigo
O episódio mais emblemático envolvendo Leonardo Pareja foi a rebelião de presos ocorrida no Centro Penitenciário de Goiás (Cepaigo), em Aparecida de Goiânia.
Ele e mais 43 detentos aproveitaram o vacilo de autoridades que vistoriavam o local e as fizeram reféns por 6 dias.
Um grupo seleto de coronéis da PM, delegados, promotores e até mesmo o presidente do Tribunal de Justiça de Goiás, desembargador Homero Sabino de Freitas.
Momentos da rebelião e a saída dos bandidos foram transmitidos ao vivo em rede nacional, projeção que aumentou o interesse em Pareja, o criminoso que tocava violão e exibia o corpo.
Veja detalhes do ocorrido no vídeo:
A fuga de Pareja
O desfecho da rebelião revelou um Pareja mais abusado do que nunca: parou o Fiat/Tempra com reféns num bar de Goiânia, deu autógrafos, comprou cigarros e bebidas.
Não satisfeito, pagou a rodada de cerveja para os clientes com nota de R$ 50 dos R$ 100 mil reais recebidos na fuga.
Um dia depois foi recapturado pela polícia num posto de combustíveis em Porangatu, região norte.
A inteligência, a beleza e o sarcasmo de Leonardo Pareja estavam com os dias contados.
“Não me considero um Robin Hood, mas confesso que me identifico com ele”
Em dezembro de 1996, ele foi assassinado por 5 colegas de presídio sob a justificativa de ter contado à direção sobre um plano de fuga.
Há controvérsia sobre essa versão, mas a realidade é que Pareja brilhou, criou modismos e terminou morto como um bandido qualquer.
Pareja, ‘herói dos presos’
A história de Pareja virou documentário, sucesso de crítica.
E uma frase reflete bem a mistura de narcisismo e egocentrismo que dominava a sua personalidade: “Eu sou um herói dos presos, gente que foi humilhada e maltratada pela polícia. Não me considero um Robin Hood, mas confesso que me identifico com ele”.
Um bandido de história excitante e fim melancólico.
Confira cenas da trajetória do criminoso no filme documentário de Régis Farias:
Desfecho da história de Pareja
Em abril de 2015, portanto mais de 18 anos depois, a Justiça condenou os 5 réus acusados pela morte de Leonardo Pareja no antigo Cepaigo.
A pena foi de 45 anos e 6 meses de reclusão em regime inicialmente fechado.
Pareja foi executado em dezembro de 1996, 9 meses depois da rebelião, por Eduardo Rodrigues Siqueira, o Pigmeu, Eurípedes Dutra Siqueira, José Carlos dos Santos, Ivan Cassiano da Costa e Raimundo Pereira do Carmo Filho.
Eles teriam planejado a morte de Pareja porque ele entregou à direção do presídio um túnel que seria usado em uma possível fuga dos condenados.
À época, Leonardo Pareja tinha bom relacionacionamento com a direção do presídio.
No dia do crime, munidos de lâminas, facas e uma pistola calibre 45, os criminosos levaram Pareja para uma cela isolada e o agrediram, fazendo “acusações de delação”.
Na sequência, segundo a investigação, Eduardo Rodrigues desferiu um tapa no rosto de Pareja e disparou 5 vezes contra a vítima.
Eles mataram outros 3 presidiários antes de se entregaram aos policiais.
Enterro de Pareja
O velório do criminoso famoso, realizado em dezembro de 1996 no Cemitério Parque Memorial, também foi marcante.
Parentes e admiradores haviam enrolado uma bandeira do Brasil no caixão de Leonardo.
Irritados com a situação, 5 policiais militares decidiram invadir o velório para arrancar o manto.
Na sequência, o caixão foi baixado à sepultura ao som do Hino Nacional.
“‘Isso é apologia ao crime, está bem claro no Código Penal”, afirmou o tenente Newton Castilho à época.
Milhares de pessoas passaram pelo cemitério e alguns levaram flores, fotos e pôsteres com fotos de Pareja.
Com a pressão causada pelo toque de várias mãos, o corpo do criminoso começou a dispensar líquidos pelas narinas.
Os custos da cerimônia foram bancados por uma entidade beneficente não identificada, assim como a sepultura foi adquirida por meio de uma doação.
Um dos também condenados foi assassinado
Após 3 anos da sua prisão, um dos condenados foi assassinado por outros detentos na Penitenciária Odenir Guimarães (POG), em Aparecida de Goiânia.
Eduardo Rodrigues Siqueira, condenado pela morte de Leonardo Pareja, foi assassinado no dia 23 de outubro de 2018.
Segundo a Diretoria-Geral de Administração Penitenciária (DGAP), ele foi perfurado por outros detentos com um “chucho”.
Por meio de nota, a DGAP relatou que Eduardo voltava do banho de sol quando foi atacado por outros 3 detentos.
Os agressores foram imobilizados por agentes de segurança.
Encaminhado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para o Hospital de Urgências de Aparecida de Goiânia (Huapa), Eduardo “não resistiu aos ferimentos e foi a óbito”.
Mãe de Leonardo Pareja
Em 2010, a mãe de Leonardo Pareja, Luzia Rodrigues Santos, conseguiu na Justiça uma indenização de R$ 105.320.44 e mais um salário mínimo, mensalmente, até 2.039.
Ela processou o Estado de Goiás pelo assassinato do filho na prisão.
Em 2020, Luzia morreu aos 75 anos em Aparecida de Goiânia.
Ela foi vítima da covid-19.
Lázaro Barbosa
A história de Leonardo Pareja voltou à tona em 2021 após a saga de Lázaro Barbosa.
A caçada ao autor de uma chacina em Ceilândia mobilizou as polícias de Goiás e do Distrito Federal.
Algo semelhante ocorreu com Pareja na década de 1990, durante sua fuga da Bahia a Goiás.
Nos 2 casos, os criminosos fugiram com a polícia a poucos passos de distância.
Lázaro e Pareja fugiram para a mata, onde se esconderam.
Em entrevistas, Leonardo contou que chegou a ver policiais a metros de distância em várias ocasiões, assim como o assassino Lázaro.
A principal diferença na história dos 2, porém, foi o desfecho.
Enquanto Pareja negociou sua entrega à polícia, chegando a cumprir pena em regime fechado, Lázaro morreu em ação policial após 20 dias de fuga.
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