Por Francisco Costa
Era madruga. O dia? 31 de março de 1964. Uma data para o povo brasileiro se lembrar. Neste exato dia o presidente legalmente constituído, João Goulart, foi derrubado e um golpe militar foi deflagrado no País.
Não houve resistência. O Brasil ficaria na mão dos militares até o ano 1985. O período, de 1964 a 1985, foi marcado por violência, repressão e ausência dos mais básicos direitos do cidadão.
Em janeiro deste ano, o deputado Tancredo Neves seria eleito o novo presidente da República. O presidente eleito faleceu e quem assumiu foi o vice, José Sarney.
Porém, o período não foi e não pode ser esquecido pelo povo brasileiro. Recentemente, o golpe completou 52 anos e muito tem sido falado sobre o assunto.
Goiás
Em Goiás, especialmente em Goiânia, a ditadura também atingiu em cheio a população. O empresário David Elias dos Santos, 52, lembra bem do período. Segundo David, na capital goiana havia uma militância estudantil muito grande. “Por isso, a ditadura mostrava em Goiânia, tanto quanto nos outros grandes centros do Brasil, sua face de repressão e violência”.
O empresário era jornaleiro voluntário do tabloide Tribuna da Luta Operária, de responsabilidade do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), entre 1979 e 1981. Dentre suas lembranças do período, as mais marcantes foram a prisão e morte do estudante Cleuber Carneiro Costa e prisão e tortura do estudante Ivo Bandeira, companheiros da época.
História trágica
Uma das histórias que marcaram a vida de David envolve a perseguição policial e prisão de um de seus amigos. “Eu e os estudantes Jordaci e Esther, parceiros da Frente de Reorganização do Movimento Estudantil Secundarista de Goiás (Fremes), distribuíamos panfletos em frente ao campus da Universidade Católica, no Setor Universário, quando certo dia a polícia nos abordou com extrema violência. Esther foi presa. Eu e Jordaci conseguimos correr, pular o muro da universidade e escapar. Ficamos até às 3h escondidos na reitoria para evitar a prisão”.
Ele conta que, após o ocorrido, durante um período, sua rotina teve de ser alterada. “Um professor me deixava na porta de casa, dava a volta no quarteirão e retornava para certificar de que eu havia entrado com segurança, devido à iminência de ser sequestrado pela própria polícia”.
Nova ditadura
Segundo ele, não há ditadura boa. “Seja a militar ou comunista”. Ele afirma que é preciso lutar para consolidar cada dia mais a democracia, não desejar o retorno dos militares. “Ter consciência política e votar no candidato certo”.
Sobre pessoas que defendem a ditadura ou que querem que aquele período se repita, David é enfático. “Há dois tipos de pessoas a favor do governo militar: a pessoa sem cultura e conhecimento da história do próprio País ou o fascista convicto”.
Para o historiador e jornalista, Carlos Eduardo Pinheiro, 32, a defesa da ditadura representa a voz de uma minoria mal-intencionada, amplificada pela falta de profundidade e desinformação de usuários de redes sociais.
Estado manchado de sangue
De acordo com o historiador, Goiás foi palco de um dos momentos mais sangrentos da ditadura militar no Brasil. “Radicais de esquerda agrupados por uma dissidência do Partido Comunista Brasileiro (PCB), sob o nome de PCdoB, então na ilegalidade, partiram para a região do Bico do Papagaio, na fronteira entre Pará, Maranhão e Goiás para a luta armada contra o governo militar”.
Ele explica que, para conter os guerrilheiros, os militares fizeram três campanhas, com pelo menos dez mil homens. O saldo final foi de pelo menos 70 desaparecidos. “Além disso, Goiás era visto pelos próprios militares como região estratégica no País. É importante destacar também a figura política de José Porfírio, o primeiro líder camponês eleito pelo PCdoB, em 1962. Com o golpe, ele entrou na clandestinidade. Foi preso em 1972, interrogado no Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), em Brasília, e liberado. Depois desapareceu…”
De lá pra cá
Apesar dos inegáveis avanços democráticos, com fortalecimento das instituições e eleições democráticas bem realizadas e pluripartidarista, Carlos Eduardo ressalta que não se pode esquecer que a Polícia Militar está cada vez mais forte e central na sociedade brasileira, com o discurso militarista e intolerante, com respaldo das autoridades. “Nesse ponto não houve de fato ruptura com a ditadura militar”.
Segundo ele, ainda é possível ver resquícios do regime na maneira como a PM trata a população pobre do País, com prática de tortura e desaparecimentos. “A Comissão da Verdade pode sanar essa falta de ruptura, com o levantamento de dados de desaparecidos e torturados e punições destes. Pode ser o começo do fim da Polícia Militar. Há muito que fazer”, conclui.
Períodos da ditadura
Governo Castello Branco (1964-1967)
Governo Costa e Silva (1967-1969)
Governo da Junta Militar (31/8/1969-30/10/1969)
Governo Medici (1969-1974)
Governo Geisel (1974-1979)
Governo Figueiredo (1979-1985)
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