Tenho certeza de que você conhece alguém assim. Pessoa idealista. Cheia de boas intenções. Levava a maior fé no PT oposicionista do século passado. Empolgava-se com a severa vigilância moral que o partido exercia sobre os governos e governantes aos quais se opunha. Enfim, o partido de seus amores não roubava e não deixava roubar. Percebia maracutaias a quilômetros de distância.
Essa pessoa votou no Lula, em vão, durante três eleições. Persistiu até que, finalmente, em 2002 – Aleluia! Lula se elegeu. A partir daí o PT poderia investigar tudo e nada permaneceria oculto nas gavetas e nos armários. Com a posse de Lula em 1º de janeiro de 2013 passavam às diligentes e virtuosas mãos do partido todos os meios necessários para acabar com a colorida tucanagem. Até um novo procurador-geral o PT nomeou em junho de 2013 e ele recebeu as chaves das silenciosas e supostamente cúmplices gavetas de seu antecessor. Mas o novo procurador – surpresa! – nada desengavetou, que se saiba. Nem ele, nem a PF, nem o CADE, nem a Receita Federal, nem a ABIN, nem o BC, nem a CGU. Silêncios sepulcrais! Na miríade de ministérios, repartições federais, empresas estatais e agências, nada apareceu, nem que fosse para comprovar minimamente o muito que antes se denunciava. Nem um grampeador sumido. E olha que depois de tanto estardalhaço, de tanta reputação assassinada, havia um certo dever moral de apontar pelo menos duas ou três falcatruas. Afinal, todos os contratos, concorrências, convênios que vinham dos nebulosos tempos pretéritos, estavam ali, para serem vasculhados, escrutinados. Mas nada foi feito ou, se feito, nada foi dito. O assunto se dispersou como uma nuvem que passa sem chover.
Um ano e meio depois, o PT virou alvo do maior escândalo político da história republicana! E nem para se defender o partido decidiu fuxicar no governo tucano. Já os escândalos petistas e de seus associados, esses não mais pararam, numa sequência infindável. Não satisfeito, o PT se uniu aos maiores patifes da política nacional. Trouxe ao braço e abraço todos aqueles a quem combatera. Santo Deus! Sarney virou homem forte no Congresso. Renan Calheiros, Jader Barbalho, Fernando Collor (até ele!) prosperaram como fungos à sombra do novo governo. Maluf virou aliado, merecedor de afagos, com fotos para a mídia benevolente em meio às ninfas e tritões de seus jardins.
Por mau caráter ninguém deixou de ser recrutado para a corte petista. E o outrora sensível faro do partido não percebe mais a sujeira nem na sola do próprio sapato. O infeliz eleitor sobre cujas agruras iniciei falando, ainda defensor ferrenho do petismo, ainda movido pela afinidade ideológica, tem que ir catar nos tenebrosos armários e gavetas dos governos anteriores (aqueles que o PT dizia conter assombrações) motivos para exalar, em derradeiro suspiro, alegações de que “os outros eram ainda piores”. Não é de causar compaixão? Deve doer como um nó de tripa na consciência. Logo ele, um cidadão do bem, um varão de Plutarco, precisa argumentar como aquele sujeito que defendia a namorada com alegações de que as outras eram ainda mais vadias. É um caso de mansidão submissa. Mas o amor é lindo.
Percival Puggina é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no País
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