Sessenta e três por cento das prostitutas que atuam em diferentes áreas da cidade do Rio de Janeiro realizam, a cada seis meses, a testagem para o HIV e outras Infecções Sexualmente Transmitidas (ISTs). Mas encontram pouca ou nenhuma política pública com foco na prevenção. Os dados constam na amostragem qualitativa feita com 30 mulheres profissionais do sexo em diferentes áreas da cidade do Rio de Janeiro realizada pela Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) em parceria com a FIOCRUZ e pesquisadoras/es associados/as ao Observatório da Prostituição (Lemetrô/UFRJ). E foi lançada durante o debate “Saúde e Direitos em Contextos de Prostituição – Efeitos da Copa do Mundo no Comércio Sexual do Rio de Janeiro”, na quarta, 10, no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS/UFRJ), no Rio de Janeiro.
A amostra “Política de Saúde, Resposta ao HIV e Prostituição no Rio de Janeiro: um estudo de caso” – da série “Análise do Contexto da Prostituição em relação a direitos humanos, trabalho, cultura e saúde no Brasil” recebeu o apoio da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro. O propósito é oferecer um panorama sobre as políticas de saúde no estado e município do Rio de Janeiro direcionado às profissionais do sexo e com foco privilegiado nas políticas de enfrentamento ao HIV e a AIDS.
Além das prostitutas, a amostra também ouviu seis gestores de programas de HIV e AIDS da Secretaria Estadual e da Secretaria municipal de Saúde do Rio de Janeiro, 18 profissionais de saúde que atuam na rede municipal do Rio de Janeiro e uma profissional da Secretaria Municipal de Saúde de Itaguaí. Também foi realizado um survey com 45 gestores de HIV AIDS de outros municípios do Estado do Rio de Janeiro.
“A pesquisa constata que há lacunas nas políticas de resposta ao HIV voltadas para as mulheres profissionais do sexo. É preciso debater os muitos fatores que explicam essas falhas de modo a criar condições que garantam o acesso com dignidade dessas profissionais ao sistema de saúde”, afirma Sônia Corrêa, pesquisadora da ABIA e co-coordenadora do Observatório de Sexualidade e Política (SPW, sigla em inglês).
O estudo por amostragem revela, por exemplo, que das 45 Coordenações Municipais de DST/AIDS do estado do Rio de Janeiro, a maioria (62%) não desenvolveu nenhuma ação com profissionais do sexo nos últimos dois anos. Apenas 13% têm atuado em parceria com organizações locais de profissionais do sexo. E um percentual um pouco maior (26%) mantém interação direta com as prostitutas ou com pontos de prostituição em seus municípios.
Os dados também confirmam um estudo recente realizado durante a Copa do Mundo, com o apoio da ABIA: não existem atividades de informação, educação e distribuição de preservativos promovidos pelo sistema público de saúde nos pontos de prostituição de rua ou mais acessíveis.
Estigma
As entrevistas com as profissionais do sexo mostram que as prostitutas utilizam um mix de serviços públicos e privados. Do total das entrevistadas, 6,6% têm planos de saúde, sendo que 16, 6% pagam os planos para pais/mães e filhos (as). De acordo com o levantamento, muitas das prostitutas que tem acesso a serviços privados trabalham em casas que exigem a realização periódica de exames médicos. E são as profissionais do sexo que pagam integralmente ou parcialmente por estes serviços oferecidos pelo estabelecimento.
No que diz respeito à relação com os serviços e os profissionais de saúde, 63% das mulheres entrevistadas disseram que sempre informam aos médicos (as) que são garotas de programa e nenhuma delas afirmam ter sido discriminadas ou estigmatizadas por fazerem isso. Entretanto, as demais (36%) temem informar sobre a profissão por vergonha e medo de julgamentos morais.
O estudo conclui que “esse mosaico de problemas de saúde (…) indica que, de fato, a saúde das profissionais do sexo não pode ficar reduzida a saúde genital ou ao HIV. (…) Num contexto como o brasileiro onde (…) são escassas ou débeis as políticas de saúde para profissionais do sexo, uma perspectiva de saúde ocupacional permitiria ampliar o campo de produção de indicadores e de respostas a demandas de saúde por parte desse grupo populacional e contribuir para o reconhecimento do trabalho sexual como uma questão de trabalho.”
O documento “Política de Saúde, Resposta ao HIV e Prostituição no Rio de Janeiro: um estudo de caso” – da série “Análise do Contexto da Prostituição em relação a direitos humanos, trabalho, cultura e saúde no Brasil” – estará disponível para download no Observatório Nacional de Políticas de AIDS que será lançado em breve pela Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS.
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